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NOTÍCIA

V Encontro de Saberes e Sabores reforça mensagem de sintonia entre conservação socioambiental, agroecologia e segurança alimentar

Data: Terça-feira, 25/10/2016 00:00
Fonte: Por Sucena Shkrada Resk/ICV

 

 

 

A 5ª edição do Encontro de Saberes e Sabores realizada na comunidade Nova Esperança, no Projeto de Assentamento Nova Cotriguaçu, no município de Cotriguaçu, Mato Grosso, destacou a importância de se estabelecer as conexões entre conservação socioambiental, agroecologia e soberania alimentar. Um público estimado de aproximadamente 250 pessoas participou do evento, neste domingo, dia 23, que manteve uma atmosfera de simplicidade promovida pelos pequenos produtores rurais e por representantes do povo Rikbaktsa, da Terra Indígena (TI) Escondido. A mensagem de fundo foi o papel estratégico da agricultura familiar para a segurança alimentar.

 

Cleusa Aparecida Lúcio Andrade, do Grupo de Mulheres da Esperança, que integra a Associação de Agricultura Familiar e Desenvolvimento Comunitário de Nova Esperança, destacou a importância de o evento reforçar cada vez mais a união das diferentes comunidades. Além de Nova Esperança, participaram da programação, representantes das comunidades de Santa Clara, de Ouro Verde, de Novo Horizonte, e da Aldeia.  Entre o público que foi prestigiar o evento, estavam outros agricultores familiares, autoridades e simpatizantes da região urbana e de Nova União e do P.A. Juruena, também localizados no município. “Esse é um momento de conhecer as nossas diferentes culturas. Somos todos vizinhos”, sintetizou o cacique Roseno Zokoba Rikbakta. Com esse princípio, indígenas e agricultores compartilharam espaço para venda de seus produtos.

 

Segurança alimentar e agroecologia

Na perspectiva da segurança alimentar, a agricultora familiar expôs a importância da conquista gradativa da autonomia da mulher do campo. O exemplo prático foi exposto na prática pelo Grupo de Mulheres da Esperança, que celebrou no encontro, a inauguração da cozinha, onde hoje sete pequenas produtoras rurais trabalham. Elas já fornecem pães para a merenda escolar da Escola Municipal do Campo Aldovandro da Rocha Silva e comercializam aos poucos a outros consumidores. Segundo Cleusa, outra celebração que envolve agricultores e agricultoras locais é o início da feira de Nova Esperança, que está acontecendo de 15 em 15 dias, às sextas-feiras, das 7 às 11h. Uma das regras estabelecidas para participar é o não-uso de agrotóxicos.

 

A pequena produtora rural também explicou que as participações em capacitações e feiras as têm auxiliado neste caminho, como aconteceu na Semana do Empreendedor, promovida neste mês, em Juína. Cleusa e mais duas agricultoras familiares de outras comunidades puderam comercializar os produtos dos grupos de mulheres locais e fazer um curso sobre manuseio adequado de alimentos.

 

“Vendemos as 24 bandejas de bolachas de babaçu e polvilho que fizemos e fomos o único grupo a levar a farinha de mesocarpo para ração animal, que atraiu a atenção de algumas redes de comércio”, disse Angela Ferreira de Jesus Oliveira, do Grupo Mulheres Unidas, da Comunidade Ouro Verde. Já Maria Margarida de Oliveira Barbosa, de Santa Clara, se destacou com os produtos feitos com babaçu pelo Grupo Mulheres da Paz.

 

Jovens do oitavo e nono anos da Escola do Campo com o apoio da coordenação pedagógica e do professor responsável prepararam um mesa com frutas e legumes típicos do bioma e fizeram uma apresentação falando sobre a importância dos nutrientes. O que chamou a atenção foi a amostra, trazendo a possibilidade de misturas saudáveis, como de beterraba com farinha, que são uma forma criativa de introduzir um novo hábito alimentar, valorizando os produtos do campo.

 

Solène Tricaud, coordenadora da Iniciativa de Desenvolvimento Rural Comunitário do Instituto Centro de Vida (ICV) reforçou o papel estratégico do agricultor familiar na difusão da soberania alimentar e da agroecologia e apresentou dados da campanha do combate aos agrotóxicos desenvolvida pelo Fórum Mato-Grossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento (Formad). Os agricultores familiares Dezil Valério do Nascimento, da Comunidade Santa Clara, e Helena de Jesus Moreira, da Associação dos Produtores Feirantes de Cotriguaçu (Aprofeco), sensibilizaram o público para a manutenção das sementes crioulas e dos defensivos naturais. Durante o evento, foi realizada uma feira de trocas que envolveu todos os participantes. Havia desde sementes de abóbora de moranga a feijão de porco e jambo branco, demonstrando a diversidade presente no projeto de assentamento.

 

Regras para um extrativismo sustentável

No campo da incidência política, a mobilização pela implementação de uma lei de extrativismo (Política Municipal de Uso Múltiplo e Sustentável da Floresta), que contemple os pequenos trabalhadores rurais nas diferentes cadeias socioprodutivas no município, foi apontada como prioridade por Veridiana Vieira, agricultora familiar, representante da Associação de Coletores de Castanha-do-Brasil do Projeto de Assentamento Juruena, Um ante-projeto foi elaborado no âmbito do Conselho Municipal de Meio Ambiente (CMMA) de Cotriguaçu, mas não passou na Câmara. Segundo ela, a Associação está participando atualmente na discussão da implementação de um documento que aponte regras para o segmento, no âmbito do Estado.

 

Alternativas de recuperação socioambiental

Durante a programação, Cláudio Angelo Corrêa Gonzaga, promotor de justiça de Cotriguaçu, também trouxe a questão da recuperação dos passivos ambientais para o centro do diálogo. Ele explicou que para que haja recuperações mais imediatas para a reparação do dano ambiental do desmatamento em áreas com atividade de agricultura familiar, a promotoria deu início a um projeto recentemente no município, usando mão de obra de pessoas condenadas ou que aceitaram a condição de prestarem serviços à comunidade.

 

“Essa iniciativa é destinada principalmente aos pequenos proprietários, que sequer possuem o título da terra ou teriam condições técnicas ou financeiras de reparar o dano,  prevendo um acordo com este proprietário ou possuidor da terra desmatada para que ele aceite a sujeição da área para o reflorestamento pelo Poder Público. Com isso, obtém um abrandamento das consequências do ato, como a suspensão do processo criminal), por colaborar nesta recuperação”, diz.

 

Representantes da Campanha Cotriguaçu a Caminho da Sustentabilidade, movimento da sociedade civil, que se reúne desde agosto do ano passado, reforçou a agenda da gestão participativa para a conservação ambiental e da valorização da agricultura familiar, que já fazem parte das atividades desenvolvidas pelo grupo. Já o representante do PrevFogo reforçou a prevenção a queimadas principalmente nas áreas dos projetos de assentamento do município.

 

Um bolo gigante feito pelas integrantes do Grupo de Mulheres da Esperança celebrou o encerramento do encontro. Agora a expectativa já começa entorno do planejamento da sexta edição, segundo os agricultores familiares e indígenas. Como ocorre de forma itinerante, o novo local deverá ser anunciado no ano que vem.